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08/10/2019 | BLOQUEIO VIA BACEN JUD DE MÚLTIPLAS CONTAS DO EXECUTADO: INVOLUÇÃO DA EVOLUÇÃO?

Em março de 2002, foi firmado o Convênio de Cooperação Técnico-Institucional entre o TST e o Banco Central do Brasil, para uniformizar o procedimento de bloqueio de numerários do Executado. Diversas alterações e atualizações já se realizaram, desde então.

Não se nega que esse bloqueio on line de numerário do Executado tenha permitido notável evolução quanto à efetividade do cumprimento de decisões judiciais.

Num passado não muito remoto, cabia ao Oficial de Justiça avaliador, no caso de recalcitrância do Executado em pagar o valor devido, comparecer ao endereço deste, para penhorar bens, tantos quantos bastassem ao pagamento da importância da condenação.

Na década de 90, acumulavam-se nos Departamentos Jurídicos dos Bancos ofícios judiciais perquirindo acerca da existência de contas do Executado, para que, após a resposta da Instituição Financeira oficiada, e caso fosse essa positiva, se desse seguimento a eventual busca pela constrição de valores, eventualmente, disponíveis em alguma dessas contas.

Os tempos mudaram e, hoje, as Varas do Trabalho podem, com um simples “clique” (conforme inciso XIX do art. 3.o da IN 39/2016, do TST), proceder ao imediato bloqueio on line de valores do Executado , “até o limite das importâncias especificadas” (art.13, Regulamento Bacen Jud, atualizado conforme reunião de 12/12/2018).

Entretanto, essa importante determinação: “até o limite das importâncias especificadas”, constante da ordem de bloqueio, não está sendo, efetivamente, respeitada. São frequentes os bloqueios em excesso, conquanto expressamente vedados, conforme disposto na parte final do art. 854, “caput” do CPC.

Desde que observado, rigorosamente, o disposto nos arts. 882 e 883, da CLT, e exista “requerimento do exequente” (art. 854, “caput”, do CPC), sem dúvida é razoável determinar-se a realização de bloqueio on line.

O que se pretende ponderar, sem nos afastarmos dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, é que esse bloqueio seja realizado, efetivamente, até o limite da importância devida, e não existam escusas, as mais diversas, para que o bloqueio exceda de tal limite.

Tomemos como exemplo uma pequena empresa que seja devedora perante a Justiça do Trabalho do valor de R$ 20.000,00. Cumpridas as formalidades e prazos legais, não indicou bens à penhora, nem tomou nenhuma iniciativa nesse sentido. De outro lado, o Exequente requereu a penhora on line. Ainda nessa hipótese, entendemos que em circunstância alguma se pode admitir que essa Executada possa ter bloqueado várias vezes o referido valor, em contas correntes diferentes, em Bancos e agências diferentes, via referida ferramenta, apenas porque todas essas contas possuíam saldo superior ao valor objeto da ordem de bloqueio.

Essa desproporção não pode ser tida como “normal”, ou decorrente do “ônus do negócio”, ou do “risco Brasil”, ou de “peculiaridades do sistema”, conforme já ouvimos. Note-se que, não raro, essa pequena empresa executada poderá ficar com todos os seus valores existentes em conta corrente inativos por, pelo menos, um dia todo, em razão desse bloqueio de múltiplas contas.

E não se venha argumentar que essa pequena empresa poderia buscar, junto ao seu advogado, que de imediato peticionasse requerendo desbloqueio do excesso, porque não existe essa opção de “imediato” desbloqueio. Dada a ordem de bloqueio, mesmo no caso de excesso, as contas ficarão bloqueadas por, no mínimo, 24h (!) -- isto, na melhor hipótese.

Imagine-se uma Empresa ter todas as suas contas bloqueadas por ao menos um dia inteiro. E se for o último dia para o pagamento dos salários dos empregados, ou dia do recolhimento do FGTS? E se for o dia de vencimento de dívida expressiva da Empresa, cujo inadimplemento de uma parcela possa gerar danos irreparáveis?

Ora, sendo o Sistema Bacen Jud tecnologia das mais modernas, e de reconhecidos méritos, por qual razão, antes de se determinar qualquer bloqueio on line, não se verificam os saldos das contas do Executado, algo previsto, detalhadamente, no art. 17 e em seus 3 incisos e 4 parágrafos do Regulamento Bacen Jud 2.0, e que permitiria, ato contínuo, com grande segurança, evitar excessos de bloqueio?

Ou, então, por que não se criam funcionalidades para que, mesmo havendo determinada ordem de bloqueio de múltiplas contas em vários Bancos, ainda assim, o sistema não permita que se bloqueie mais do que o valor devido, alvo da ordem de bloqueio? Ora, essa funcionalidade nos parece bastante simples de ser realizada até mesmo por um “robô” ou similar.

O que não se pode conceber é que persistam, nos dias atuais, bloqueios múltiplos, ou seja, de várias vezes o valor devido, em várias contas do Executado, gerando enorme insegurança jurídica, e ônus desnecessários às partes, procuradores, e Juízes.

A regra não deve ser a determinação da ordem de bloqueio de todas as contas do Executado, sem que antes se tenha efetuado a devida verificação de contas e saldos (prevista, como dissemos, no art. 17 do Regulamento Bacen Jud), e sim, o contrário, salvo se restarem implementadas no sistema Bacen Jud 2.0 ferramentas que deem efetividade à impossibilidade de se bloquear (independente do número de contas correntes mantidas pelo Executado) mais do que o somatório do valor objeto da ordem de bloqueio.

Nem se argumente que poderia o Executado nomear perante o sistema Bacej Jud conta única, apta a recebe bloqueios (Resolução 61/2008, do CNJ). Note-se que a própria Resolução já impõe que a mencionada conta cadastrada pelo Executado tenha saldo suficiente a fazer frente à determinação de bloqueio, e, convenhamos, não faz nenhum sentido em um Estado Democrático de Direito, em que vige o princípio da legalidade, que devam ser impostos ao Executado ônus cadastrais e de manutenção de valores parados em conta, para que a execução contra ele não se processe pela forma mais gravosa possível, isto é, mediante bloqueio de várias vezes o valor devido.

O Sistema Bacen Jud, mediante bloqueio on line de valores do Executado, é uma notável evolução para persecução da penhora de dinheiro (desde que observados as disposições legais, e outras, aqui já citadas). Entretanto, diante da possibilidade efetiva de uma miríade de bloqueios de ativos do Executado em várias contas e Bancos, a gerar manifesto excesso, é que cautelas como a sugerida são necessárias, enquanto novas ferramentas ao Sistema não forem implementadas para eliminar a possibilidade de excessos.

Cautela essa que, sem ignorar o direito do Exequente, se revela mais compatível com o trato do patrimônio da propriedade privada, princípio constitucional basilar para o pleno exercício da atividade econômica.

 

Manuel Antonio Teixeira Neto

                                Integrante do Escritório Manoel Antonio Teixeira Filho & Advogados Associados

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